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Antonio Ventura e Álvaro Alves de Faria |
Antonio Ventura sempre foi um poeta diferenciado, desde o início, quando já na adolescência escrevia versos fortíssimos, uma poesia marcante, de asfixia, aquela poesia que vem de dentro do homem, onde o homem deixa residir sua vida, equivale dizer, seu poema mais verdadeiro.
O tempo passou. A vida passou. As coisas todas passaram.
Para muitos a poesia se transformou em algo quase inútil e, nas mãos de muitos,
foi destruída.
Mas nas mãos de Antonio Ventura, um poeta fiel a si mesmo
e, o que é mais importante, fiel à sua poesia, que atravessa seu próprio tempo,
numa elaboração que ás vezes é um canto lírico e que, noutras, se transforma
num grito, desses que doem, porque saltam da alma.
Este é um belo livro de poesia, de poemas e de narrativas
poéticas. Como se nos dissesse sempre, como escreveu no belíssimo “Divino
Narciso”, ilustrado com a tela de Caravaggio: “Eu queria escrever uma história
infantil/ como a minha história infantil a história da criança louca/.../”. Um
poema comovente: “O que eu sou agora é não ter saído de casa/ mas ter ficado em
casa escrevendo um poema eterno/.../”.
Há momentos de absoluto encantamento neste livro de
Antonio Ventura, uma poesia às vezes amarga, mas de uma amargura consciente, de
gestos decepados, de voos no infinito das coisas que ainda restam, do sonho
que, embora desfeito para sempre, pode existir quando a poesia é mesmo poesia.
O poeta nos diz: "Sempre procurei o amor pelo amor
somente". Não se sabe se encontrou. Nem é importante saber. Não é
importante saber nada. Importa sim, e muito, ler poemas assim: "Gostaria
de escrever o poema mais belo/ para enfrentar o barqueiro./ mas te digo que a
primavera/ um dia chega/ sem pressa.". Importa ler coisas assim: "Uma
página apenas não dá para explicar nossa alegria,/ nosso terror e nossas
certezas/ como certeiras espadas!".
Esta, a poesia de um poeta que lida com a poesia, com o
cuidado e o zelo de um monge, daqueles que se escondem nos mosteiros e se
deixam existir, enquanto existe a vida e a poesia. Com este livro de um poeta
assim, a poesia se enobrece, porque, antes da coisa simplesmente literária, o
poema é digno de si mesmo.
O catador de palavras é, no fundo, um testemunho de vida,
aquilo que a vida nos oferece ao seu tempo, quando ao passar dos anos vem
desenhando nossa face num espelho que se quebra. Esta é a poesia de um poeta
que compreende a grandeza da poesia e faz da poesia sua própria história.
*Poeta e jornalista.
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