Ely Vieitez Lisboa
O título é do poema de Drummond,
realçando o universalismo com o substantivo comum coletivo e a semântica do
adjetivo.
Tema eterno
como o homem, pois é um sentimento que o acompanha, intrínseco a ele. O Mago de
Itabira, sintético e profundo, resume tudo sobre o medo, em onze versos, em um
pequeno poema. Inicialmente, avisa o leitor que não cantará o amor, “que se
refugiou mais abaixo dos subterrâneos”; há metáfora mais expressiva para
denunciar o mundo atual, que esteriliza abraços, carinho, amizade, tudo
contaminado pela desconfiança e pelo pessimismo?
Em um dos
versos, o quarto, o poeta diz que o ódio não existe. Pasmo, o leitor não
entende a mensagem já tão explorada por Freud. O ódio só pode surgir se
precedido pelo amor. Como odiar quem é ninguém para nossa alma, que nosso
coração desconhece? Ódio é o polo negativo do amor. É a outra face. É a sombra.
Fala-nos
Drummond de medos grandes e pequenos, reais e psicológicos, físicos e
metafísicos. Fecha a pequena obra-prima poética com uma insólita causa mortis
dos seres humanos, que, só matéria, servem de adubo a “flores amarelas e
medrosas” que nascem sobre nossos túmulos, pois nosso maior carrasco é o medo.
Fico a pensar
em afirmações discutíveis (ou ingênuas?) de quem diz não gostar de poemas. Na
verdade, é um pobre ser, mortal insensível, que nunca aprendeu a interpretar um
texto poético e não tem coragem de colocar a verdade sobre a mesa: tem a alma
deficiente, não sabe captar belezas. Não se comove com a pureza dos animais,
não se abisma diante de árvores pejadas de flores, prefere música só de ruído e
ritmo.
Alguém já
disse que as flores são um capricho de Deus. Por isso o truísmo: a rosa é a
rosa. Só tal predicativo pode explicar o sujeito. Assim como os sentimentos mais
excelsos do homem, complexos, um emaranhado insondável. Nós, seres falhos, sem
antenas, captamos apenas átimos fugazes, raros insights. O mais é cegueira, escuridão,
desacerto, seres gauches que somos.
Os poetas,
privilegiados, assinalados, antenas da raça, tentam alertar-nos a descortinar
belezas. Eles também têm suas batalhas, porque trabalham com as palavras, em
uma luta vã. Elas traem, são misteriosas. Muitas vezes se valem das metáforas
para driblar a complexidade dos termos. A comparação é mais ingênua, a metáfora
mais audaz.
Assim, caro
leitor, jamais diga a heresia que não gosta de poemas. É uma confissão
falaciosa. Na verdade, está escondendo falhas e incapacidades, não é sensível,
tem dificuldade de ver as riquezas do mundo, sofre de cosmovisão pobre, de cegueira
diante das belezas da Criação.
Ninguém ousou
ligar certos tipos de seres humanos a essa incapacidade de amar poemas.
Perguntem aos monstros beligerantes, aos déspotas, aos torturadores, aos
ladrões, aos corruptos, aos pedófilos, se eles amam poemas e flores.
Talvez tudo
isto sejam apenas digressões utópicas e tolas. A culpa é do Drummond, que
consegue, em um poema tão curto, falar dos mistérios abissais de nossa existência.
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